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Não sei minha orientação sexual, e agora?

7.11.18Dana Martins


E quando você não sabe quem você é nessa história de sexualidade?

Estava aqui vivendo minha vida quando me dei conta de que tem algo que eu nunca parei pra falar aqui no ConversaCult: a confusão. Já fiz textos ajudando a explicar orientações sexuais, e junto com a equipe e colaboradores, nós temos vários textos sobre o que é ser uma coisa ou outra. Mas e quando você tá perdido? Pode ser que você nunca tinha parado pra pensar em orientação sexual, e agora está começando a perceber que pode ser algo além daquilo que foi martelado na sua cabeça desde criança. Pode ser que você tinha absolutamente certeza da sua sexualidade! E agora... bem, e se você não for? Ou, talvez, pode até ser que você só tá sem direção no meio de um monte de palavras que você nunca ouviu falar. Seja como for, e independente da sua idade, vamos conversar sobre isso.


LGBTA+ 
L - Lésbicas
G - Gays
B - Bissexuais
T - Trans*
A - Assexuais
+ - outros grupos que entram na comunidade. 

Eu acho que esse assunto é dividido em duas partes - duas coisas que nós devemos considerar ao mesmo tempo

A primeira é que vivemos em um mundo lgbtfóbico e isso tem um bando de consequências. Por exemplo:

1. Você não sabe que pode ser algo além de hétero! 

Isso é chamado de heteronormatividade (ver hétero como a "norma"), e literalmente a gente cresce sem informação, sem conhecer os nossos corpos, sem conhecer que seres humanos existem com sexualidades diferentes e sempre existiram. Resumo: a gente é muito desinformado, então como você vai saber o que é sem saber o que pode ser?

2. Conhecimento Marginalizado

É importante entender que não existe tanto uma definição Oficial de tudo, porque o considerado Oficial na nossa Cultura já é ser hétero e o resto é ignorado. Então a própria comunidade LGBTA+ pelos meios que tem procura criar esse conhecimento e tentar divulgar. Isso significa que a discussão tá em andamento, que você vai encontrar muitas opiniões diferentes sobre muita coisa, que você vai esbarrar em muito texto com homofobia disfarçada sem saber. Infelizmente, essa é a realidade de quem não tem poder de voz na cultura dominante. 

3. Trauma!

Lgbtfobia - a homofobia, transfobia, bifobia - são coisas sérias, que machucam. A gente cresce aprendendo a ter medo, vergonha, a querer esconder e até a ter raiva. Literalmente, chamar os outros de gay é usado como uma forma de inferiorizar os outros. É muito ruim. Isso atrapalha todo mundo, porque todo mundo aprende a não querer se associar com coisa LGBTA+ ("Pô, cara, tô te estranhando!") e esconder isso, até a ter nojo. Mas pra quem é LGBTA+, isso ainda cria trauma e bloqueios. Você é todas essas coisas "consideradas ruins", e você cresce sempre sendo podado e ensinado a ter vergonha. 

O nosso primeiro impulso - de todo mundo - é querer se afastar. "Eu sou gay, mas não sou como os outros gays!" ou "Ah, eu não preciso de rótulos." Você é LGBTA+, mas você cresceu aprendendo que ser LGBTA+ é ruim, mas você não é ruim! Então talvez você seja o diferente! Você não precisa das coisas que todas as outras pessoas LGBTA+ não precisam. Essa é a alternativa boa, a alternativa ruim é que você tem se machucado desde sempre acreditando que é ruim. 

Um outro efeito desse trauma é que as pessoas acabam se agarrando às suas identidades e grupos, até como uma forma de proteção pra não ser soterrado nessa cultura que vive tentando apagar a existência das pessoas LGBTA+, então muitas das discussões do assunto acabam sendo OU VOCÊ É ISSO, OU VOCÊ É AQUILO, e tem até gente que começa a virar porteiro tentando criar regra pra definir quem é de Verdade. 

É importante entender isso porque muitas vezes a "confusão" vem desses anos todos de preconceitos, de traumas, de você ignorando quem você é e se afastando (ou ignorando as outras pessoas). E porque você não vive no vácuo. Mal ou bem você é parte de uma sociedade onde existe um grupo considerado o "Normal" e o resto todo é constantemente repudiado. Questionar e romper essa tal "Norma" imposta é algo que você vai ter que enfrentar, querendo ou não. É algo que você já tá enfrentando, lendo esse texto. E a comunidade LGBTA+ tem uma história linda (e às vezes dolorosa) de resistência. Todas essas manifestações, "rótulos," passeatas e até gírias e piadas são fruto dessa resistência. Se hoje você tá lendo esse texto aqui e acha que pode viver do jeito que você é, e até ter direitos sem existir leis no seu país que proíbam a sua existência fora da Norma, é porque essa gente e cultura que você vai sentir vontade de se afastar lutou pra te proteger. 

Então os nomes de orientação sexual (homo/gay/lésbica, bissexual/pansexual, assexual) são importantes, espalhar conhecimento é importante, parada gay é importante, comunidades e lugares seguros LGBTA+ são importantes. Espero que um dia você encontre seu lugar na comunidade e entenda o valor de lutar, juntos, para terem direitos básicos e ser reconhecido.

Agora que você entende um pouquinho sobre o contexto de ser LGBTA+, vamos para o outro lado. 

A questão é que às vezes, em certos momentos, a gente precisa mandar o mundo e todo mundo se foder pra poder se entender sem tantas vozes dizendo o que a gente tem que ser ou não tem que ser. A gente tem que entender que todo o contexto que eu dei é importante, e ao mesmo tempo que a gente precisa ignorar tudo para se ouvir. O principal nessa conversa é paciência.

É saber que sexualidade é algo fluido, ou seja, que pode ser de um jeito por um tempo e pode ser de outro jeito depois. Não tem idade pra perceber que você não é hétero. Ou pode ser do mesmo jeito pra sempre. 

É saber que você não precisa decidir nada, não precisa dar satisfação a ninguém sobre a sua vida, que responder "Eu não quero falar sobre isso" é uma resposta válida. 

É saber que tem um monte de coisa ruim que você precisa desconstruir. Uma das coisas discutidas quando se fala de heterossexualidade compulsória, por exemplo, é como garotas são ensinadas desde pequena a se tornarem atraentes pra homem. Toda a moda feminina e até produto feminino é feito com o objetivo de deixar mulher atraente pra homem. Às vezes, mesmo depois que a garota percebe que só gosta de mulheres, ela ainda tem toda essa bagagem de que suas roupas e o modo de vestir precisam ser atraentes pra homem. Enfim. Você entendeu.

É saber também que como o seu corpo funciona e como você quer se apresentar são coisas diferentes. O seu corpo é algo natural, ele sente atração pelo que sente atração, ele gosta de quem ele gosta. Isso não é escolha. Se fosse escolha, não era mais fácil todo mundo escolher ficar perdidamente apaixonado por um melhor amigo ou qualquer um próximo? Por que é tão difícil encontrar aquela pessoa que mexe com você do jeito que nenhuma outra mexe? PORQUE NÃO É ESCOLHA CARALHO. Tu pode dizer que é o que você quiser, mas você vai continuar sentindo e querendo o que o seu corpo sente - e se você fica ignorando e escondendo isso, você não tá tendo uma vida verdadeiramente livre. É lindo pensar que "logicamente" você pode fazer o que quiser, mas não viver a sua vida livre e não se permitir amar ou não amar quem você quiser tem um preço. Literalmente machuca, pode levar a doenças mentais e, na melhor das hipóteses, só a infelicidade. 

Mas, novamente, se permitir viver e reconhecer como o seu corpo funciona não significa que você precisa dizer que é uma coisa ou outra. Digo isso porque mais de uma vez vi situação tipo um cara gay que tava sozinho e aí uma noite gostou da atenção de uma garota e entrou em crise, mas ele gosta de homem e só quer ter coisa com homens. Não precisa de uma crise ou tudo isso por causa de algo que você fez em uma noite ou um caso muito específico. Tem uma frase que eu vi uma vez e sempre lembro, "sexualidade é um jogo de média." A vida é muito grande pra gente questionar cada detalhe. 

Além disso, essa necessidade de querer ser algo e se encaixar e definir até o dedão do pé pode ser muito ruim e gerar mais confusão. Orientações sexuais (ser gay, pansexual, assexual, bissexual) são pra ser guias, te mostrar o caminho do que você pode ser, não pra te dizer o que você tem que ser e que se você não se encaixa perfeitamente o tempo todo ali dentro você não é mais. Então pensa: o que é a média pra você? O que você sente vontade?

AGORA: isso que eu acabei dizer só serve se você não é hétero, porque graças a homofobia tem muita gente que diz que é "hétero," mas continua buscando relação com gente do mesmo gênero e mentindo pra si mesmo. Você faz o que quiser e só você sabe o seu lado, mas esse comportamento específico é muito tóxico pra quem é LGBT+ e normalmente é um resultado do que eu citei lá em trauma por causa da lgbtfobia. 

Continuando, mais uma pergunta: Você tá trabalhando com a vida real ou com conceitos? A gente fica falando, falando e falando, na internet tem tanta informação sobre SER TAL COISA É ISSO, mas às vezes a gente precisa é de colocar os pés no chão e olhar ao nosso redor. De quem você gostou até aqui? Por quem você sente atração agora? De preferência, pessoas reais que você encontra no dia a dia e não personagens fictícios e atores intangíveis.

E, principalmente, por que você sente tanta necessidade de dizer que é algo? 

Eu sempre gosto de reforçar que essa porra toda é pra ser humana. Eu não vejo sentido em ficar se preocupando com orientação sexual se não é pra te fazer bem. E, de fato, faz bem pra um monte de gente. Faz as pessoas encontrarem uma comunidade e amigos que a tratam bem e respeitam. Ajuda a aumentar a visibilidade na cultura dominante. Faz jovens lgbt+ que crescem perdido terem pra quem olhar em vez de se torturarem com a homofobia. Faz as pessoas saberem que existem seres humanos diferentes. Mas o ponto é ajudar a sua vida. Ser um guia, não uma caixinha. 

A não ser que você queira questionar. que você queira aprender sobre si mesmo. que você esteja gostando disso e querendo viver assim. Nada de errado pensar que era uma coisa e depois ver que não era aquilo.

Aliás, a gente fala muito sobre quem é isso ou aquilo, mas ainda mais pra quem tá aprendendo, a gente esquece de todas as histórias de como a pessoa percebeu. O que mais tem é gente gay que começa dizendo que é bissexual e depois percebe que só tem atração com gente do mesmo gênero. E também tem um monte de gente bissexual que gostou de uma pessoa do mesmo gênero e pensou que era gay até ficar sabendo que dá pra sentir atração por mais de um gênero. 

Se você não sabe qual caminho seguir, dá um tempo. Não tem pressa. Pra que você quer saber disso agora? Deixa em aberto. Vai viver a sua vida, vai gostar de quem você gosta e, principalmente, sem medo de ir atrás de algo que te faz bem. E se você encontra uma identidade agora que te representa, vai na fé. Você não precisa ficar paralisado porque um dia pode acontecer algo diferente. 

ORIENTAÇÕES SEXUAIS - GUIA RÁPIDO
Bissexual - você pode sentir atração por mais de um gênero 
Pansexual - você pode sentir atração por todos os gêneros
Homossexual (gay, lésbica) - você pode sentir atração pelo gênero igual ao seu
Heterossexual - você pode sentir atração por um gênero diferente do seu
Assexual - você não sente atração sexual (mas pode sentir romântico)
Demissexual - você sente atração sexual só depois de ter um vínculo forte

No ConversaCult tem diversos textos sobre cada um. Leia e aprenda sobre. :)

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8 comentários

  1. Olá, tudo bem, parei esses dias para pensar e realmente eu não sei onde me encaixo. A situação é a seguinte, sou biologicamente homem e tenho uma atração sexual por homens, o que teoricamente me classificaria como homossexual, mas em nenhum momento eu sinto atração romântica por um homem, o que me deixa na dúvida, pois se eu fosse homossexual eu me apegaria emocionalmente a um homem, mas em mim só existe o desejo sexual por um homem. Já no outro lado em se tratando de mulheres, eu até posso sentir alguma atração sexual, mas não é nada quando comparada a atração que eu sinto por um homem, mas em contraponto quando se trata de mulheres o que eu sinto é um desejo e um apego emocional, com o qual eu quero realmente ter uma história, um namoro e um casamento. Será que sou bi? E se eu for pq só sinto uma atração sexual por uma pessoa do mesmo gênero?

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    1. Tipo, atração romântica e sexual são duas coisas diferentes. Essa parte você parece entender, mas isso significa que talvez seja possível você sentir atração sexual por um e romântica por outro. Porém, a vida é muito mais complexa que isso, porque outras coisas além de atração influenciam a gente. Por exemplo, uma hipótese: talvez você só não tenha encontrado alguém com quem tenha se conectado de verdade?? Às vezes eu até penso que sou assexual de tanta gente que eu não sinto atração, mas aí aparece UMA que "Pera aí..." e daí entre sentir atração e acabar gostando da pessoa é outro caminho.
      Outra hipótese, que é algo muito comum quando se trata de gente LGBT+, é que por causa da heteronormatividade as pessoas crescem aprendendo a entender só romance f/m. É como se os tipos de relacionamento fossem línguas diferentes e a gente só aprendesse a ler uma, então a gente não sabe nem interpretar romance acontecendo entre pessoas de mesmo gênero. Isso causa, por exemplo, pessoas LGBT+ enxergando romance em atos entre personagens do mesmo gênero que outras pessoas simplesmente ignoram porque aprenderam a ler esses atos como amizade. A heterossexualidade compulsória também faz as pessoas, mesmo que LGBT+, a idealizarem e criarem expectativa em relacionamentos f/m. É algo real, você foi condicinado a querer uma forma de relacionamento e foi criado em mundo que diz o tempo todo que pra se sentir completo você PRECISA desse seu par f/m. Então mesmo que seu corpo funcione de um jeito, você ainda fica buscando essas coisas. O caminho pra se livrar disso e descobrir o que você realmente quer começa reconhecendo essas coisas, investigando esses desejos. Eu não posso dizer o que você realmente quer.

      E você pode ser bi ou pan sentindo atração só por alguém do mesmo gênero. O importante não é se preocupar em como dizer o que você é, mas usar essas identidades pra saber que você pode ser exatamente do jeito que você é, mesmo se isso for alguém com atração sexual por um e romântica por outro.

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    2. Oi, Lucas, por incrivel que pareça há ainda muito a superar da "heteronormatividade"! Em 1993, outros tempos, mas eu aos 27 anos e meu colega com 35 anos, faziamos Faculdade, fomos ficando amigos, trabalhando em Equipe e,me pareceu um "ritual" que muitos casais heteros começavam a fazer, quando me convidou a visitar os pais dele. Conversei com a familia, depois pedi licença e fui tomar banho! No quarto a luz de abajour, assisti um pouco de TV, até ele sair do banho. Chegando no quarto, desceu a toalha e, começando a me penetrar, comentou que eu segui ritual não de amigo em casa de amigo, mas de dois homens, mesmo cis, que nos completavamos!No dia seguinte, antes de sair, pai dele, reservado, me disse, sejam felizes e comentei sei que fomos o primeiro um do outro. Sorriu e me disse, seja bem vindo, meu genro!

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  2. Meu caso é o seguinte: eu acho que me sinto atraída por garotas. Pq eu falo "acho" pq eu basicamente nao sei o que sentir atração de verdade. Quando eu penso em amor e sexo, a primeira coisa q me vem a cabeça é eu fazendo isso com uma mulher, mas também com homens. Eu me fantasio tendo uma namorada,e realmente tenho vontade de ter uma. Mas acontece q na vida real eu so "me apaixonei" por homens. Coloquei as aspas pq na infancia eu era tao iludida pq eu so achava alguem bonito e falava q gostava dele, ou seja eu nao sabia o que era amor. Depois q eu cresci um pouco veio um especifico q eu me atraí, mas quando ficamos bem mais proximos eu percebi q nao era aquilo q eu queria. Com todas as coisas q eu disse acima pode-se pensar q eu sou lesbica, mas na verdade eu me acho bissexual pq eu gosto dos dois. Mas como eu disse, so "gostei" de meninos ate agr. E eu tenho muito medo de falar q eu sou bi e no fim isso tudo de gostar de mulher for so uma fase ou uma coisa da minha cabeça. Meu maior problema é que eu nao sei o que é atração! Como é q eu sei q gosto de homem, ou mulher, ou os dois, ou nenhum? Ninguem nunca me falou ou me orientou sobre isso...

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  3. Ai ai... Como posso explicar isso...? Bem, eu tenho fantasias sexuais e fetiches, sinto vontade de fazer eles acontecerem, mas não sinto exatamente excitação, só um prazer sem ter sexo com a pessoa.
    Eu converso sobre relações sexuais com os outros e até zou, mas sempre que alguém tenta fazer algo comigo, até mesmo me beijar (dentro ou fora de um relacionamento amoroso) eu desvio do assunto e digo que não tô afim.
    Eu sinto atração por mulheres e homens, sinto vontade de toca-los, mas não quero que me toquem.
    Isso é bem confuso, então é difícil de explicar corretamente.
    Queria ajuda pra entender essa minha... Suposta loucura haha

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  4. Também nao sei qual a minha orientação sexual.

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  5. Não sei a minha sexualidade. Há alguns anos eu poderia me definir como bi-curioso, mas de lá para cá experimentei de tudo com homens, e continuo a mesma coisa, não sinto nenhum tipo de atração por nenhum, só um desejo extremamente fetichizado que aparece as vezes. Quando tento algo fora dessas condições, é uma experiência horrível para mim, realmente não gosto de homens a não ser em situações muito específicas, preferencialmente com a participação de mulheres junto. Já cheguei a me declarar bi e voltei atrás depois, não sei como me definir, pq não sou exatamente hétero, mas quando me dizia bi automaticamente as pessoas achavam que eu tinha vontade de ficar com homens e sentia atração por eles, e isso não é verdade também kk.

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  6. Cara eu não sei se sou bi ou gay por que eu sinto atração sexual e romântica por homens, e mulheres eu só sinto atração romântica será que eu sou gay?

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