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A minha jornada de aceitação

31.10.16Isabelle Fernandes


Olá, meu nome é Isabelle e eu sou assexual.

Não há forma melhor de começar esse post HGUDFHGUDFHGUDFHG. Tudo começou na Semana da Visibilidade Assexual do ano passado, quando a Ariel, que ainda nem era parte da nossa equipe, publicou esse post sobre a demissexualidade. Cara, meu cérebro deu um verdadeiro nó.


E por quê? Porque eu me identifiquei horrores.

Sabe, desde quando entrei na adolescência e os hormônios de todo mundo explodiram, eu me sentia meio diferente. Deus sabe que nessa época o povo fica doido, meninos e meninas com um fogo impressionante e totalmente obcecados com beijo de língua e gírias sexuais (pelo menos na minha época né...acho que hoje em dia estão trocando nudes). Geral querendo se pegar, ir pra matinê (isso ainda existe?), pirando quando via gente pelada e eu me sentia o peixe fora d'água. Eu não conseguia entender esse auê todo em torno de trocar saliva com desconhecidos. Tudo o que me importava era saber se o crush me notava.

Até aí tudo bem, né. Eu achava que ainda era muito criançona e que depois, quem sabe, eu ia ficar que nem todo mundo, além de que algumas amigas também não curtiam (fosse por princípios ou timidez). Daí veio meu primeiro namorado, as primeiras pegações e eu totalmente "cara....sério? SÉRIO QUE É ISSO?". Eu gostava do meu namorado, mas essa parte de beijar, dos amassos...preferia mil vezes estar fazendo qualquer outra coisa. Daí ele terminou comigo porque me achava muito fria, sofri e fiquei com raiva, voltamos e assim foi até que por fim acabou. E por muito tempo eu fiquei achando que não devia gostar dele de verdade, já que odiava os beijos.

Quando eu digo muito tempo, quero dizer ANOS
Depois disso eu tive mais algumas paixonites, mas sempre à distância. Fui ficando mais velha e me acostumando cada vez mais ao universo sexual, passei a ter interesse e a querer viver as experiências que de repente todas as colegas e amigas estavam vivendo e adorando. Eu não me via fazendo nada com ninguém, então fiquei esperando estar num relacionamento. Foi aí que eu enfim encontrei o cara por quem eu me apaixonei e pensei "AHÁ, AGORA VAI". O meu corpo respondia normalmente, e muito bem. Eu achei que enfim ia sentir tudo aquilo que todo mundo dizia sentir eee...nada. Quer dizer, apesar de não ter dado lá muito certo, eu gostei e fiquei pensando em tentar de novo, mas eu não vi nada de especial, sabe?

Lembrando hoje e sabendo o que eu sei, posso comparar a quando você não está com fome mas se depara com uma comida que você queria muito comer e manda pra dentro mesmo assim. Só que na época eu não entendia o que estava acontecendo e a partir daquele momento eu tive a certeza de que tinha alguma coisa errada comigo. Antes e depois desse namoro eu me interessava pelos caras, ia pros encontros animada, só que por mais que o interesse ainda estivesse lá, acabava dando uns perdidos pra nunca mais encontrar eles porque me vinha uma angústia danada. Eu pensava "alguma hora vai ter uma investida e como é que eu vou dizer não sem o cara achar que não quero nada com ele?". Quando eu falava sobre isso com as amigas, algumas me diziam que eu só não tinha encontrado a pessoa certa ainda ou que eu só estava com medo e que precisava vencer isso.

Eu tentava me convencer disso, mas sentia que tinha alguma coisa errada.
SOFRÊNCIA e CONFUSÃO define
Então quando eu li aquele texto da Ariel, eu finalmente encontrei ALGUÉM QUE ME ENTENDIA!! Eu finalmente comecei a perceber que não, eu não era estranha, nem tinha algo errado comigo, nem precisaria de tratamento pra "resolver o problema", como eu já estava começando a acreditar.

Eu comecei a entender que sou assexual. 

Só que claro, isso foi um processo. Um pouco mais de um ano, pra ser precisa, de muitas dúvidas, de muitos momentos em que eu achei que só estava procurando uma razão pra desculpar as minhas esquisitices, minha suposta "covardia". Eu pesquisei muito, corri atrás de mil sites em inglês e português, entrei em contato com páginas sobre assexualidade, tive crises existenciais com amigas extremamente compreensivas, enfim. Só depois de tudo isso é que eu pude realmente aceitar a minha identidade, porque no fundo eu já tinha certeza.

Imagem verídica da minha pessoa durante essa fase
Passei a entender que o fato de eu gostar de ler romances eróticos, de falar sobre sexo e surtar por homens, de querer ter um relacionamento romântico, ser quase extrovertida e entre outras coisas que vão contra os estereótipos de aces não me invalidam de forma alguma. Continuo sendo assexual porque a característica primordial é a ausência de atração sexual, e é o que eu vivencio e, de acordo com as análises das minhas experiências, sempre vivenciei.

Agora, por que eu tô aqui escrevendo esse textão sobre um tema que na prática só diz respeito a mim? Por visibilidade. Foi graças a um relato que eu comecei a minha jornada e essa semana fiquei sabendo que um post meu ajudou outra pessoa. Quanto mais posts informativos e relatos existirem, mais aces ainda não descobertos podem iniciar suas jornadas e mais pessoas alossexuais poderão entender que a gente EXISTE e nos respeitar.

"Nós não somos invisíveis"
Precisei de um mês inteiro pra enfim tomar coragem e escrever esse post HAHUFHSUFHDSUFHDSUF e acredito que está valendo a pena. O medo de ser julgada ou até mesmo hostilizada sempre vai existir, mas eu ia não ficar tranquila comigo mesma sabendo que fiz um mês inteiro de visibilidade e me escondi. Então, é isso aí.

Até o Doctor sabe o quanto bolo é bom HGUHGIUDHG

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18 comentários

  1. "Quer dizer, apesar de não ter dado lá muito certo, eu gostei e fiquei pensando em tentar de novo, mas eu não vi nada de especial, sabe?"
    ESSA FRASE. SIM, MIL VEZES SIM.
    Affff amo posts assim porque sempre dão aquela sensação de "eu não estou quebrada", "eu não estou sozinha". Mesmo sentindo menos INTERESSE, me identifico horrores com todo o resto. ♥

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  2. Nunca ouvi falar sobre fobia com assexuais, se eu falasse que sou assexual para meus pais eles iriam até me aplaudir, rs Mas como sou GAY, nossa, é como se gay fosse o ser mais sexual do universo e tudo que vem com sexo pode ser pecaminoso e etc.

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    1. A questão não é haver fobia com assexuais, e sim a invisibilização por trás. Por exemplo, a Bells falou (e eu testemunhei, somos melhores amigas e eu a acompanhei por essa jornada toda) que tudo o que ela falava era tomada como timidez excessiva, ou procurar chifre em cabeça de cavalo. Por que é tão difícil aceitar que uma pessoa pode não ter atração sexual? Essa é a discussão no texto. Não é sobre "sua opressão é maior do que a minha", "veja como é difícil ser eu", é "Minha existência não invalida a sua, portanto, respeite quem eu sou."

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    2. Faço minhas as palavras da Carol, e ainda acrescento:

      Beleza, você nunca ouviu falar. O que você quer dizer com isso, que não existe? Cuidado com a forma de se expressar, porque inclusive pode dar a entender que você está sendo preconceituoso.

      Sobre a hiperssexualização, isso é um problema sério e válido. A nossa sociedade é muito dúbia com relação ao sexo: ao mesmo tempo em que se assume que todo mundo quer transar/tá transando/sente atração sexual, também tem essa ideia de que o sexo é "safadeza", "pecado" e etc. Com lésbicas, gays e principalmente bisssexuais isso ganha uma dimensão maior, claro, mas é uma questão que atravessa a vida de todo mundo, inclusive assexuais.

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  3. bells, você é linda e esse post é maravilhoso <3

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  4. queria escrever 1 monte sobre esse texto, mas só consigo dizer 1 coisa:

    BRIGADUUUUUU

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  5. que post incrível!!! passei por muito do que você passou, principalmente na fase da adolescência e me descobri assexual logo depois... imagina procurar sobre isso uns 10 anos atrás? não tinha informação nenhuma!! não tinha TUMBLR!!! mas vi um ou outro site sobre, liguei os pontos e percebi que era assim e por mais que eu queria (e quero ser diferente as vezes) não dá pra mudar.. o mundo em relação a representatividade está mudando aos poucos. vi a Dana falando de livros com personagens assexuais o que é super raro existir em 2016, mas acho que +10 anos vai realmente existir representação Ace em filmes, séries, livros (coisa que não existe hj e faz MUITA falta né)

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    1. Sobre a representação ace: quando tem, ainda é absurdamente estereotipada e faz as pessoas acharem que somos robôs insensíveis sem alma.

      E nossa!! Por isso é TÃO importante a semana da visibilidade assexual <3

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  6. BELLS, EU TE AMO <3

    E sim, quando eu fui lendo sobre demissexualidade foi exatamente a mesma sensação, de que eu não estava sozinha e que alguém finalmente me entendia. <3

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  7. Ah esse texto <3 <3 <3
    É sempre bom ler esse tipo de coisa pq conforta sabe. Li um texto parecido do Felipe (Não sei lidar) e foi tipo o melhor texto do mundo e agora vem vc é cara isso é muito nobre da parte de vcs. O que acontece é que ninguém acredita que é possível ser assexual. Sexo é tipo a engrenagem que move o mundo e quando nosso corpo não reage a isso da forma comum é como se tivéssemos uma anomalia. Cmg tbm sempre rolou o lance do "Ah mas vc não encontrou a pessoa " "Ah mas vc não se permite, é mt fechada, é mt tímida e bla bla bla.
    Acho que sempre soube que era assexual mas não consigo aceitar isso me aceitar sabe. É doloroso e me deixa muito mal ser assim. É como se eu fosse ficar sozinha pra sempre é enfim. De qualquer forma obrigada por essa declaração.

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    1. Foi o texto do Felipe que me motivou a escrever o meu. Eu vi que tinha uma ferramenta maravilhosa em mãos (o CC) que poderia ajudar várias pessoas da mesma forma que ele já me ajudou.

      E não, você não vai ficar sozinha pra sempre. A sociedade pode fazer você achar que sim, mas não é verdade. Existem 16436436 formas de relacionar e você pode encontrar aquela que se encaixar melhor em você, ou simplesmente descobrir que relacionamentos não são a sua praia. Também pode encontrar amigos que te aceitem do jeitinho que você é, sejam os atuais, sejam novos, seja em fóruns pra aces onde basicamente todo mundo ali passa por coisas parecidas.

      Enfim, VOCÊ NÃO ESTÁ SOZINHA

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  8. Este comentário foi removido pelo autor.

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  9. Em primeiro lugar, parabéns pelo texto e coragem de expor-se! Estava vagando pela madrugada numa ideia que vem me perturbando há algum tempo... Tive interesse por relacionamento sexual entre 18 a 26 anos, mas depois disso o interesse por leitura, ver documentários ou até aprender outros idiomas se tornou bem mais interessante do que "catar" pessoas pra ter sexo. Até olho algumas mulheres e vejo aqueles corpos como atraentes, mas me sinto mais atraído por uma conversa envolvente, principalmente se a moça tiver gostos similares aos meus. Porém, se pede pra encontrar ao vivo, já tiro o corpo fora e volto pros documentários e livros (ou séries). Sai de uma relação e foi muito difícil explicar a pessoa que eu não estava sendo frio e nem estava traindo, até pq eu nem paciência tenho para ficar catando gente nova para "enrolar" até perceber que querem sexo. As vezes tenho que ouvir frases do tipo: "Não sei pq te adicionei, vc nunca lê minhas mensagens ou demora a ler e quando lê não responde na hora". Boa parte dessas eu já percebo que o interesse é além da amizade e começo a sentir que devo evitar pq vai chegar ao ponto de marcar aquele encontro (sexual) e eu só queria comer algo junto e ver um bom filme...(seee rolar sexo após esse "ritual", não é de todo ruim, mas se percebo que o encontro era só pra isso...Já saio de casa cabisbaixo e talvez nem saia ou chegue bem atrasado para evitar o obvio). De uns tempos pra cá, até meus games se tornaram mais excitantes que sexo em si. Achei que estava ficando doente, até decidir procurar se existe gente com o mesmo pensamento... É um conforto saber que não é único, nestes casos.

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    1. Uma coisa é se interessar por sexo, outra é se sentir sexualmente atraído por alguém.

      Tanto que muitos aces tem vontade de ter relacionamento sexual, eles só não se sentem atraídos por ninguém nesse sentido (ou em situações específicas).

      E obrigada o/

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