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O texto que você não quer ler

1.1.17Dana Martins


HEY, FELIZ 2017! E como todo dia 1, eu busco algum post especial para ser o primeiro do ano no ConversaCult. Algo que me inspire e eu espero que inspire você também. O primeiro que eu fiz, por exemplo, foi o "criar algo magnífico a partir do nada". Só pra refletir sobre o poder da arte, como através da própria habilidade você pode dar vida a um personagem e imagina o poder que esse personagem pode ter sobre o mundo? 

E pra 2017 não seria diferente, só que... de certo modo, foi.

Quando eu decidi que esse seria o texto de estreia de 2017, eu fiquei um pouco na dúvida. Porque é sobre aquilo que a gente não gosta de ler. Mas aí eu lembro de 2016 e acho que isso é o que a gente precisa agora. Espero que o texto de hoje inspire você a fazer um 2017 melhor.

Regra número 1 do texto: SE VOCÊ ESTÁ SE SENTINDO DESCONFORTÁVEL, POR FAVOR CONTINUE A LER.

Sério.

Esse texto é inspirado em um que eu vi no tumblr "Uma Lista de Coisas para Gente Branca em Fandom Fazer". O texto é especialmente para pessoas brancas, mas eu não consigo deixar de incluir aqui pra dizer que isso serve pra todas as minorias. A gente vai sentir isso quanto a mulheres. A gente vai sentir isso quanto a questões LGBT+. A gente vai sentir isso discutindo acessibilidade. 

A gente vai sentir isso toda vez que escutar alguém oprimido falar, porque nós estamos acostumados ao silêncio.

Enfim.

Aqui a tradução da parte principal do texto:

Para dar contexto: eu trabalho com instrução de escrita e eu devoto uma boa parte das minhas aulas discutindo representação na mídia. Por que? Porque eu percebi que eu fazia tudo o que esses posts falam sobre: Ignorando personagens de diversas etnias, colocando eles no fundo pra ter vilões brancos ou como ajudantes que aparecem muito menos, ignorando mulheres negras (e de outras etnias) completamente, etc. E o tempo inteiro, como muitos de você, eu disse, "Eu não sou racista." Eu tinha explicações que faziam sentido dentro do universo pra por que eu gostava 'desse ship em vez daquele, esse personagem mais do que aquele.' Eu poderia defender e explicar tudo.

Racismo não é quem você é. Mas o que você faz. E aqui um fato: Todas as pessoas brancas fazem coisas racistas. Nós somos treinados pra fazer, ensinados a fazer. Está na nossa cultura, ao redor de nós. Se você é branco, a nossa cultura permitiu que a maior parte do racismo seja completamente invisível para nós. Racismo não é apenas xingamentos gritados. Muitas vezes, racismo é simplesmente *não se importar* com pessoas que não são brancas. Racismo é a inabilidade de ter empatia ou se importar com uma história de alguém que não é branco.

SE VOCÊ ESTÁ SE SENTINDO DEFENSIVO, POR FAVOR CONTINUE A LER. Eu imploro a você. Esse é exatamente o sentimento que nós temos que enfrentar. Eu vou te dar uma pequena lista de ações que nós podemos tomar. E eu sei que elas são importantes porque eu tenho que fazer, o tempo todo. Porque o veneno está em mim também.

1. SEJA CORAJOSO O BASTANTE PARA FICAR DESCONFORTÁVEL. É absolutamente chato perceber que você machucou alguém, ou que talvez você esteja errado. Perceber que você fez algo racista é um choque de realidade. Tenha coragem pra enfrentar isso. Não fuja.

2. EM VEZ DE PROCURAR AS RAZÕES DE VOCÊ NÃO SER RACISTA, PROCURE AS MANEIRAS QUE VOCÊ É. Tentar mostrar que nós temos a mente aberta é confortador e tentador. Mas não se deixe ficar confortável. Em vez disso, procure ver o que você faz e os modos que você pode contribuir. Talvez seja compartilhando e criando gifs que deixem de fora os protagonistas negros. Talvez seja esquecendo de incluir na sua fanfic, mesmo quando eles tenham o direito de estar lá. Talvez seja reduzindo-os a estereótipos ou 'cuidadores' dos personagens brancos. Talvez seja shippar o protagonista branco com qualquer um menos as pessoas de outras etnias ao redor dele. Talvez seja acusando fãs de "começar drama" quando tentam discutir racismo. Olhe para suas ações e seja honesto com si mesmo.

3. SE ESFORÇAR PRA SE APAIXONAR POR PERSONAGENS DE DIVERSAS ETNIAS. Aqui está um detalhe: é mais fácil para nós se apaixonar por hérois e vilões que sejam homens brancos. É o que nós fomos treinados a vida inteira pra fazer, com cada filme, série e livro que nós gostamos. A mídia nos *encoraja* a amar homem branco. Então sim, se apaixonar por um personagem de outra etnia vai ser difícil e provavelmente não vai 'só acontecer' (...)

4. ESCUTE PESSOAS NEGRAS (/DE OUTRAS ETNIAS). Sim, até se eles estão irritados e te xingando. Pra minha pesquisa, eu passo muito tempo em blogs que falam muito sobre odiar pessoas brancas, odiar fãs brancos e odiar as feministas brancas. A linguagem é furiosa e ácida. E daí? Eles têm todo o direito de estar irritados. Em vez de julgar a raiva deles, ESCUTE. Tente fazer melhor. Não diga "nem todos os fãs brancos" ou "nem toda gente branca." Em vez disso, tente ser uma pessoa branca melhor. Seja um fã branco que é corajoso o bastante pra olhar pra si mesmo e realmente ser um aliado. Não silence fãs negros. Eu prometo a você: Escute e você vai ver que eles não estão exagerando.

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Na tradução no geral eu só pulei umas partes de "SE VOCÊ QUER SER UMA PESSOA MELHOR", porque eu acho horrível o conceito de hierarquizar pessoas e, ainda mais, quando se importar com os outros vira medalhinha de validação pra se sentir melhor que alguém. Mas acho que no geral e, principalmente você que tá lendo isso, a questão é mais não querer distribuir ódio e opressão, só que a maneira de parar com isso não é ignorando o que você faz, é percebendo e mudando, por mais desconfortável que seja.

Então vou completar com um comentário adicionado no mesmo post por outro user:

"E eu gostaria de acrescentar que não é o bastante dar reblog em posts que fazem você se sentir um bom aliado... Leia o ponto sobre se sentir desconfortável mil vezes porque parece parece que um monte de vocês se esquece disso. Parece que o problema é que aliados pensam que é o bastante discutir racismo quando é confortável, mas no segundo que a discussão força a pessoa a se olhar no espelho a conversa fica ruim. 
Eu vejo isso o tempo todo... Aliados pensando que estão fazendo um bom trabalho enquanto tudo o que eles fazem é chamar atenção do comportamento dos outros que não os força a confrontar a própria realidade. É sempre uma discussão externa. E não é o bastante. Você precisa tirar um tempo pra si mesmo e tentar demais desaprender comportamentos tóxicos. Em fandom isso é difícil de fazer. Especialmente quando a conversa está fazendo você confrontar coisas na mídia/personagem/ship que você ama. É importante reconhecer as coisas quando nós mostramos. Não é bom o bastante só compartilhar posts sobre raça no fandom quando você ainda se recusa a fazer um autoexame profundo."

Se 2016 me ensinou algo, o maior perigo não vem de fazer a coisa errada, mas de como você reage a estar errado. Eu já falei aqui inúmeras vezes e vou repetir: ninguém faz representatividade perfeita. No mundo real, ninguém é livre do machismo, lgbtfobia e racismo normalizado na nossa cultura. Nós crescemos no meio disso. Nós aprendemos a ver opressão como regra. Nós não enxergamos os problemas. Então até a gente ser confrontado, vai fazer muita merda. E quando menos as nossas crenças são confrontadas, é mais provável de que elas sejam tóxicas. Isso não é bom, mas o fato de que falamos merda é uma realidade. Se você acha que não faz nada, é provavelmente porque tá fazendo. 

Então se eu desejo uma coisa aos leitores do ConversaCult em 2017, essa coisa é: se permita ficar desconfortável.

É horrível.

Ainda mais que normnalmente pra gente isso significa ver problemas em um autor que a gente gosta muito.

Reconhecer que a razão da gente enxergar química e querer que certo casal fique junto é homofobia internalizada, ou racismo.

Às vezes até é ter que enfrentar um campo de guerra bem no fandom que a gente queria acreditar que é só pureza e amor.

Mas é necessário.

Então se permita ficar desconfortável e escute. Aprenda. Porque acho que esse é o único jeito de chegar a algum lugar.


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É isso! Aproveite 2017, que esse ano seja muito melhor. E se você quiser conversar sobre algo, tem dúvidas mas tem medo de perguntar por não querer ofender ninguém, pode falar comigo. Eu inclusive tenho o Batdrama, que é onde eu compartilho meus aprendizados e falo merda tentando aprender as coisas. É uma newsletter que você pode se inscrever clicando aqui.



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2 comentários

  1. Texto muito interessante. Lógicamente, não concordo com todos os pontos (especialmente com o 4; sei que "complicada" ainda é pouco para descrever todo essa situação, mas isso não é uma justificativa para se odiar um ou todos os fãs brancos. Seria bom discutir com uma pessoa que se sente assim e tentar compreender o ponto dela, mas não vejo como poderia ser positivo dar suporte a isso), mas a reflexão ainda é bastante válida.

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    1. Isso, é claro, digo logo após ler o texto... quem sabe o que vou pensar depois de um tempo?

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