abuso sexual Amber Heard

O perigo de não acreditar na vítima

19.11.16Dana Martins


Eu fiz meu post sobre o caso do Johnny Depp que bate em mulher vs. Johnny Depp como Grindelwald em Animais Fantásticos e Ondem Habitam, e aí ainda tem o velho caso de gente que se recusa a acreditar na Amber Heard. Então por acaso eu acabei reunindo uma coleção de trechos sobre vítimas de violência (doméstica, sexual), pra questionar a nossa própria tendência a duvidar da vítima.

- Um em cada 3 brasileiros culpa mulher em casos de estupro, diz Datafolha

- "Eu contei pra ela [alguém da família] o que aconteceu. Eu disse 'Eu preciso falar com a polícia, isso é errado.' Ela me desencorajou. E isso foi varrido pra baixo do tapete. E eu carreguei isso por anos."

- "Se você se identificar publicamente como um sobrevivente de violência sexual você vai lidar com gente dizendo que você mentiu. Que você consentiu e na manhã seguindo mudou de ideia." (x)

- Medo de denunciar é algo normal numa sociedade que culpa as vítimas, não acredita nelas ou vê o estupro delas como algo menor – desde a polícia e o médico legista até a família, amigos e jornalistas. Mas é preciso romper o silêncio. Não cometer as atitudes acima é uma boa forma de ajudá-las e acabar com a estatística nefasta: apenas 3% dos estupradores são condenados. Ninguém é culpado até prova contrária, mas simplesmente não levar a sério uma denúncia de crime é um absurdo que deve ser combatido incessantemente.

- Minimizar quando o estuprador é famoso. E ainda ajudá-lo com seu apoio. Isso ocorreu no caso do Kobe Bryant e do R. Kelly, e pode estar ocorrendo no caso do Woody Allen. É impossível separar uma coisa da outra. Claro que uma pessoa pode ser um estuprador e também um brilhante cineasta ou esportista. Mas você quer ajudar a enriquecer e a dar visibilidade social e até política a alguém que abusa de outras pessoas? (x)


- Mito #1: Você não pode confiar em denúncias de estupro porque costumam ser falsas

- O estereótipo de falsas alegações de estupro é uma ocorrência comum, e é uma ideia errada amplamente perpetuada por diversas partes da sociedade, incluindo policiais, que tem consequências concretas e diretas. (x)

- Isso contribui para o enorme problema de poucas denúncias feitas por vítimas de estupro ou abuso sexual.

- "Às vezes, o processo de denunciar acaba sendo mais violento pra essas mulheres do que a própria violência", disse à BBC Brasil Silvia Chakian, promotora de Justiça e coordenadora do GEVID (Grupo de Atuação Especial de Enfrentamento à Violência Doméstica). 

- Quando consegue vencer as dificuldades de fazer uma denúncia, a mulher vítima de violência precisa passar por outro processo complexo: o de conseguir comprovar o crime. Primeiro porque alguns tipos de agressão não deixam vestígios – a violência psicológica, por exemplo.

E, segundo, porque algumas marcas são "facilmente contestáveis" por advogados de defesa. "Na lei aqui, muitas vezes a discussão fica em torno do consentimento. E aí em uma violência que acontece entre quatro paredes, não tem testemunha", explica Chakian. (x)


- A violência contra as mulheres assume muitas formas – física, sexual, psicológica e econômica. Essas formas de violência se inter-relacionam e afetam as mulheres desde antes do nascimento até a velhice.

- POR QUE AS MULHERES AGUENTAM TANTO UMA RELAÇÃO VIOLENTA?

2. Procurar ajuda é vivido como vergonha e gera muito medo.

5. Negação social - Quando pedem ajuda, as vítimas de violência se defrontam com pessoas despreparadas e desinformadas sobre o problema que elas estão vivendo. Cada vez que um médico,um psicólogo, um líder religioso, um policial ou um advogado as trata com indiferença, desconfiança ou desprezo, contribuem para aumentar a violência. Quando isso acontece, as vítimas perdem a esperança de encontrar apoio externo e acabam se recolhendo novamente ao seu inferno particular.

6. O verbal é também um sinal que pode preceder a violência física. O(a) agressor(a) poderá ser cruel, depreciativo, grosseiro. Tentará convencer sua parceira de que ela é estúpida, inútil e incapaz de fazer qualquer coisa sem ele(a). (x)


- Se você tende a acreditar o abusador antes do abusado, saiba que você está perpetuando essa cultura. Quando nós agimos com precaução diante de violência completa, depredação e trauma, nós ensinamos lições que não podem ser desaprendidas.

- Quando nós não acreditamos nas vítimas de estupro, nós criamos mais delas. 

- Nós dizemos a mulheres que não confiamos em seu intelecto ou julgamento ou inteligência básica.

- Nós criamos um cenário específico que depende da nossa aceitação, enquanto desvalida as outras. Nós dizemos a mulheres que se elas não foram violadas de uma forma bem clara, fácil de entender e outras maneiras aceitáveis, elas não foram violadas. (x)

- A narrativa de "[Amber] Heard está mentindo" é extremamente familiar

- Não é realmente uma surpresa que tantas pessoas pensem que Heard está mentindo. Isso acontece normalmente quando uma mulher acusa um homem poderoso e amado de tê-la machucado. Mas diz muito o fato de que essa narrativa ainda persiste mesmo quando Heard fez mais do que o necessário para provar. 

- E nós repetimos a mesma história em uma escala menor quando mulheres que não são famosas acusam homens que não são famosos. Nós dizemos que essas mulheres quase sempre são mentirosas, que elas não foram realmente machucadas, e que elas só estão mentindo para destruir um homem inocente. Estatisticamente, isso quase nunca é verdade, mas nós falamos isso de qualquer forma.


- O caso da Heard é um exemplo perfeito de quão mal nós tratamos vítimas de violência doméstica

Aqui é que está: Heard foi para a polícia quando aconteceu. Ela foi até a polícia com hematomas recentes, visíveis em seu rosto.

Ela deu evidências. Ela deu evidências de fotográfica e testemunhas e mensagens de texto para provar sua história.

Ela não está atrás do dinheiro. Ela doou tudo.

Ela fez, de todas as formas, exatamente o tipo de vítima que nós dizemos que as mulheres devem ser se nós queremos acreditar nelas.

Não importou. Nós ainda falamos que ela estava mentindo. (x)



Enfim, o caso é que: você não precisa defender ou justificar o caso da Amber Heard pra gostar do Johnny Depp ou de Animais Fantásticos e Ondem Habitam. 

Toda vez que você tenta explicar, ou duvidar, você está colaborando para esse ciclo de violência contra a mulher e impunidade. 

Se alguém falar da agressão que a Amber Heard sofreu, você precisa discordar ou desvalidar o que o Johnny Depp fez? Qual é a sua necessidade de fazer isso? 

Indico muito ler o texto do Vox, do último trecho, que tem dados sobre o caso de violência doméstica entre o Johnny Deep e a Amber Heard, e analisa essa cultura de descrédito da vítima. 

Envie esse texto para pessoas que não entendem o impacto de não acreditar quando uma mulher tenta falar sobre uma agressão. 

*quando eu usei mais de um trecho do mesmo texto, o link de referência está no último.



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1 comentários

  1. Não tem nem mais o que comentar depois desse ótimo post. Só não enxerga a situação quem não quer mesmo.

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