302 autoimagem

Uma conversa sobre nudez e exposição

13.4.16Taiany Araujo

*Algumas das fotos apresentadas nesse post são do fotografo Mustafa Sabbagh.  

Há um tempo atrás eu escrevi um post aqui no CC sobre um projeto maravilhoso chamado Apartamento 302 ou só 302 mesmo, como aparece nas esquetes no Canal Brasil e se você não leu o post essa é a hora: acesse o link e depois volta pra cá.



Bom, espero que você tenha ido ler e achado interessante, porque eu vou falar mais sobre ele. Vamos lá?

Apesar de ter conhecido o projeto na TV enquanto trocava de canal incessantemente procurando algo para ver, passei a assistir aos ensaios online e depois de ter visto todos disponíveis, acabei deixando pra lá. No entanto, alguns dias atrás uma amiga veio me mostrar um ensaio nu belíssimo de uma fotografa da cidade dela, eu me lembrei do 302 e fui ver se tinha mais vídeos (tinha). Fui assistir e recordei da indagação que fiz na primeira vez que tomei conhecimento do programa: por que não fazer um com homens?


Entenda, a questão não é a nudez corporal, é o desnudar da alma, é falar sobre medos, preconceitos, família, religião, sexualidade... é se expor. E como é interessante observar que apesar de todo o apagamento da mulher, toda a repressão sofrida por nós, é mais comum ver uma mulher se expondo (pelo menos aparentemente) que um homem. Em alguns vídeos, as mulheres falam como foi para as famílias e amigos verem que elas tiraram a roupa para a internet, para um livro, e talvez isso não fosse tão desconfortável para o meio de convívio daqueles que ali estão, se eles fossem homens. Tirar a roupa não seria visto como vulgaridade, invasão, exposição. Vocês já repararam que os livros e filmes sempre vendem que os homens estão confortáveis com sua nudez, enquanto as mulheres automaticamente se escondem? É claro que a mídia vende o que quer vender, e nem tudo ali reflete a realidade, mas isso não quer dizer que ela não interfere na maneira em que vemos o mundo e nos comportamos.

Assim, voltando para a questão da exposição, enquanto que para as mulheres expor o próprio corpo pode ser encarado como coisa de “gente fácil”, para os homens isso não gera grandes repercussões (mesmo isso sendo algo meio questionável. Vide como a mídia “apresenta” o nu feminino e o masculino. A Elilyan escreveu dois posts falando disso, vale a pena dar uma olhada: Nudez masculina e a polêmica do pênis de um milhão de dólares e Sem vergonha: a naturalização da nudez e do sexo nas séries de TV). Porém, mulheres expondo suas angústias, inseguranças e vida de uma forma geral é algo que a gente vê (e isso é ótimo, estamos ganhando voz), porém os homens parecem ainda estarem sob o ideal machista de não apresentar "fraqueza”, como se mostrar quem você é, um ser humano com sentimentos, fosse um sinal disso.

Obs: Para fomentar mais essas questões de nudez masculina e feminina vale a pena conferir esse texto Pode e não pode: Fotógrafa discute liberdade da nudez feminina no Facebook (FOTOS), sobre as repercussões de fotos nuas de homens e mulheres nas redes sociais.

Sempre ouvi homens se perguntando por que mulheres vão ao banheiro juntas e o que tanto elas conversam e a minha indagação estava numa linha similar: será que os homens falam entre si sobre suas inseguranças, sobre coisas no próprio corpo que não gostam, será que no “mundo masculino” existe um “papo de banheiro”?  É claro que eu indaguei a alguns amigos e alguns falaram que sim, outros que nem tanto. Pronto, meu questionamento foi solucionado, homens e mulheres se sentem à vontade ou não para falarem sobre sua privacidade. No entanto, isso ainda não havia sido o suficiente para aplacar meu desejo de um projeto como o 302 voltado aos homens, porque quando você ouve aquelas histórias (das mulheres do projeto) há uma identificação muito grande com as pessoas que ali estão. Você tira as mulheres do ideal imaginário e traz pra realidade, você percebe que não está sozinho com suas angústias, você quer fazer parte daquilo, de se libertar das roupas que vestem (e não estou falando as roupas propriamente ditas), há um desejo que também se desnudar, de ser.


Eu queria ver um projeto desses com homens porque esse projeto vem me ajudando a me enxergar, aceitar, amar, entender, e eu gostaria que isso alcançasse a todos. Que os homens também ficassem diante uma parede branca, sem nada, sem barreiras, sem travas e expusesse não só o seu corpo, expusesse algo mais íntimo ainda: quem eles são, quem são as pessoas que infelizmente ainda são separadas pelas características biológicas. Na verdade, o projeto que desejo ver nem é um com homens, é um com qualquer pessoa que queira fazer parte. Jorge Bispo se você por um acaso estiver lendo esse post, pense com carinho em um Apartamento 302 onde o foco seja enxergar o que há por trás da nudez de todos.


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