A arte de produzir Efeito sem Causa companhia das letras

[Resenha] A Arte de Produzir Efeito sem Causa, de Lourenço Mutarelli

14.2.14Anônimo

- Livro: A Arte de Produzir Efeito sem Causa
Autor: Lourenço Mutarelli
- Editora: Companhia das Letras
- Comprar: Saraiva, Cultura
- No Skoob












Minicrítica - Resumo:

Júnior acaba de abandonar casa, família e emprego. Morando com o pai e sua inquilina, a universitária Bruna, ele vai levando os dias sem motivação, se arrastando em uma rotina de álcool, mentiras e negação. Quando misteriosas caixas sem remetente começam a ser entregues para ele, é o estopim para ele ficar louco. A rotina de Júnior não muda, mas muda a forma como ele a enxerga, cada vez mais confusa e alheia a realidade. A própria narrativa muda para transmitir o estado do personagem, provendo uma super experiencia de leitura bastante diferente e um pouco assustadora.

Ei, lembram daquele filme do qual a Michelle estava falando um dia desses, “Quando Eu Era Vivo”? (Se não lembra, pode ir lá reler a resenha dela, eu deixo). Bem, ele foi baseado nesse livro aqui, então se você gostou da história (ainda dá tempo de ver no cinema), vale a pena dar uma olhada. Mas saiba que a adaptação é bastante liberal.

O que encontrará depois do clique é uma história um tanto diferente.

Mutarelli tão assustador quanto o livro.
Ambientado nas ruas de São Paulo, o livro conta a história de Júnior - ou melhor dizendo, conta a história da sua saúde mental. O encontramos quando busca a casa do pai no centro da cidade, depois de abandonar sua própria. Antes de alcança-la, é roubado - na minha opinião, um momento simbólico: perde assim seu último contato com a vida que deixou. Ao chegar, é recepcionado por Sênior, um homem prático que esconde um cerne sensível. Não nega abrigo ao filho, mas como já possui uma inquilina, a descolada estudante de artes Bruna, só pode lhe oferecer o sofá para ele dormir. E é o que ele faz.

E continua fazendo.

Júnior não sente vontade nenhuma de organizar sua vida, tampouco de enfrentar o evento traumático que o levou a abandonar esposa, filho e emprego. Passa os dias enrolando o pai, dando investidas em Bruna e indo ao bar gastar um dinheiro que não tem. Quando uma caixa sem remetente é enviada para ele é que percebemos que há coisas estranhas no homem. Algumas palavras se confundem em sua cabeça. Não importa onde vá dormir, sempre acorda no sofá. E isso é só o começo.

Os demais personagens não sofrem enormes mudanças durante o livro, que se foca na transformação interna de Júnior. A maneira como ele vê e interage com os outros moradores da casa muda no decorrer das páginas, refletindo seu estado psicológico. São dadas sugestões para a origem desse comportamento conforme conhecemos mais do passado da família, mas o foco do texto não é nesse tipo de conclusão.

Exemplo de arte que separa os capítulos.
O aspecto mais interessante do livro é o alinhamento de forma e conteúdo. Quanto mais alterado o personagem, também mais o texto se desconstrói. A narração fica não linear, freqüentemente retornando segundos no tempo para acrescentar detalhes às ações recentes. Sonhos, memórias e delírios vão se misturando, tornando impossível determinar onde a realidade começa ou termina. Há lapsos de tempo cada vez maiores. Até mesmo o ritmo do texto se altera. Na reta final, os parágrafos são tão extensos e delirantes que causam um profundo estranhamento. A arte do livro vêm para reforçar ainda mais o conceito.

Você sente pelo livro o que Sênior e Bruna sentem por Junior. Estranhamento, confusão, medo e desconforto. O livro se afasta de você conforme Junior se afasta das pessoas a seu redor. De certa forma, o que consigo perceber desta obra é que narração e personagem são uma coisa só. Você não apenas presencia a história, mas sente ela acontecer com você. Foi nessa nota que terminei a leitura, um pouco chocado, um pouco emocionado e ainda incerto de minha relação com esse livro.

Sua leitura é fácil e rápida, mas os sentimentos que surgem no processo demandam lenta digestão. É recomendado, porém exige o estado de espirito certo para tirar o melhor da leitura.

(3,5 de 5 Conversinhas)


A Companhia das Letras é uma linda e nos cedeu um exemplar para que essa resenha pudesse existir. Obrigado!

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