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Klaine e o que Glee reproduz da cultura do estupro

10.3.17Colaboradores CC


Não faz muito tempo que Glee fez seus dois anos de encerramento, e todos os Gleeks ficaram um pouco na nostalgia pesada por causa disso, tenho duas amigas que até estão revendo a série, acho que pela quinta vez... Agora, com isso, veio uma discussão muito importante. 


Há pouco tempo, eu e minha Isabela Duarte (citando ela aqui), estávamos conversando sobre Klaine, Faberry e Hevans - Kum para alguns - e fomos parar numa discussão com um grupo de fãs da série. Eu e ela gostamos de Klaine, mas nem por isso negamos que é um casal que tem muitos problemas a serem resolvidos, para não dizer tóxico. 

E essa deve ser a reação de vocês nessa hora...

Vamos começar pelo quão bom é Klaine, por ter ajudado todos nós com algo que não se via em rede aberta com facilidade na época, um casal entre duas pessoas do mesmo gênero, e também os beijos. Claro que tiveram vários problemas, mas não podemos negar que foi algo lindo de se ver na televisão e com tanta coragem, ajudando adolescentes a se entenderem (eu, inclusive) afinal, só vi Glee ano passado e isso me ajudou muito comigo mesmo. Para entender mais sobre tudo de bom que Klaine representa, leiam o texto da Ariel, 6 anos de Klaine e porque isso importa

Agora, apesar de ser um dos primeiros casais LGBT+ que apareceu – que eu lembre – em rede aberta, não anula que tiveram muitas coisas que deveriam ter sido reparadas, que mesmo quando eu super shippava, reparei... 

CUIDADO COM OS SPOILERS DA SEGUNDA TEMPORADA EM DIANTE 

 - Na segunda temporada, tem todos os problemas do Kurt com o Karofsky, e todos os Klaine shippers amam o conselho dado pelo Blaine, falando que Kurt precisava de mais coragem para enfrentar o garoto que o machucava. Porém, o Kurt nunca perdeu a coragem ou deixou de lutar contra isso, claro que ficou desanimado e tals, mas nunca parou de lutar. O problema, é que esse conselho é péssimo, afinal, como ele vai enfrentar um cara do dobro do tamanho dele? Claro que não ia acabar bem. 

 - Quando o Blaine foi para o colégio para proteger o Kurt, no meio do corredor insinuarem que ele era gay, não seria nada bom. A cena do Kurt cantando "Don't Cry For Me Argentina", em que o Blaine faz um gesto para que o Kurt abaixe a mão... O que é engraçado, afinal, depois falam pro Kurt que ele tem que parar de forçar algo. Mas tudo bem o Blaine pular sobre os móveis, entre outras coisas. 

 - Aquela cena que é impossível esquecer em que o Blaine falou para o Kurt que ele tentando ser sexy parecia que estava com dor de barriga. 

 - A bifobia do Kurt que me deixou com o coração bem murcho. 

 - Quando a Mercedes pergunta para o Kurt quando ele vai/se vai voltar para a escola e o clube, mas o Blaine se mete e responde por ele. 

Altas lembranças de Klaine. Shippei? Muito. 

 - O episódio em que o Kurt acreditava que fazendo o Tony para a peça, era a chance dele entrar para NYADA, eles conversaram e Blaine disse que não iria tentar o papel, o problema é que ele cantou uma música do Tony (então tipo, tem certeza que você não ia tentar o papel?!), afinal, sabendo que o Kurt precisava ele ainda sim cantou a música, e por mais que pareça que não foi com a intenção de ficar com o papel, cantando a música do Tony, mostra claramente que ele iria ter aquele papel. 

 - Um pouco depois, chegamos ao episódio 'The First Time', em que o Kurt fala em eles darem um passo a mais, porém o Blaine nega, dizendo que ele iria esperar para quando o namorado se sentisse confortável para seguir em frente; o problema, é que um pouco depois de perceber que ele estava indo mais devagar com o Kurt do que quando estava com o Sebastian mais o lance de "eu preciso ter isso para atuar melhor", ele decidi que quer ter sua primeira vez com o Kurt, e o que estou reclamando aqui, é que não foi uma escolha por "nossa, eu amo ele, e eu quero ter isso por ser com ele.", mas sim por motivos egoístas. 

 - Quando o Blaine encontra o Sebastian sem avisar o Kurt, mesmo sabendo que ele o queria de volta, coisa que o Kurt só descobre quando flagra eles.

Eu passando a imagem que estou bem, quando na verdade meu coração tá murcho de reviver todas essas lembranças de casal perfeito ruindo.
 - Por último, mas não menos importante, a cena em que eles vão para a boate gay com o Sebastian. Kurt topou ir, mas não queria e todos podiam ver isso, e seu namorado poderia ter reparado, mas não reparou, então okay... Mas seguindo, ele passa a noite toda dançando com o Sebastian e bebendo e bebendo sem parar, então na hora de ir embora (na cena do carro) eles se beijaram e Blaine tentou convencer o namorado de fazer sexo, mas ele negou, falou que não queria e não é não, mas o Blaine continuou insistindo, continuou beijando ele, acariciando ele, e o Kurt teve que se soltar e empurrar ele, apesar de não ter a mesma força - naquela época - que o ex-Warbler. Foi uma tentativa de estupro. E ele ainda tem a audácia de se fazer de o pobre coitado, afinal, seu namorado não queria brincar com ele depois de ter passado a noite toda dançando com o 'ex-alguma coisa' que claramente queria ele de volta. E claro, ele se desculpa com a Rachel, porque o Kurt e ele não fizeram nada e ele não poderia ser um bom Tony... 

Quando a ficha cai e você percebe que é verdade. Foi bem assim comigo na época. 

Óbvio que eu teria muitos outros motivos para apontar, como o Blaine ter namorado o Karofsky, mesmo que ele tenha evoluído e se aceitado e se desculpado com o Kurt, não apaga e não deleta as sequelas que ficaram no Kurt. E também não estou falando que o Kurt é um santo, afinal, ele descontou nos outros suas decepções e tristezas. PORÉM, eu cheguei onde queria, as tentativas de estupro (ou estupro) sendo justificados através desses erros, deixando uma parte da sociedade desinformada. 

Em Glee isso ocorreu demais, essa justificação horrenda de estupro, ou a venda sobre nossos olhos quando se trata sobre os estupros, é só voltar para a primeira temporada e analisar, ou só assistir normal mesmo, que você percebe que o sexo de Quick (Quinn e Puck) foi um estupro, afinal, o Puck foi embebedando ela, e se alguém - sim, já tentaram - vir defender ele, eu tenho a lei como apoio, tanto aqui no Brasil como nos EUA, é dito que se a pessoa não tiver discernimento total do que está fazendo com alguém ou está sendo forçada àquilo, é estupro. E ainda nisso de embebedar alguém, tem uma cena, já na segunda temporada, que a Rachel na semana da conscientização contra o álcool diz que nunca bebeu e o Finn fala: "Sério? Agora entendi porque nunca transamos.". 

Nessa questão do álcool, lembro dessa cultura do estupro que já está enraizada na nossa sociedade. Nós, homens, somos ensinados por amigos, algumas vezes até pessoas da família que se embebedarmos alguém, essa pessoa 'cederá' mais fácil, e então você vai poder ficar com ela até cansar. Glee, por mais desconstruído, errou muito nisso, e continuou errando pelas próximas temporadas, não só nesse ponto, mas em outros.

Não estou falando disso para que se crie raiva de Glee ou dos roteiristas, até porque é uma das minhas séries favoritas, mas que a gente perceba que não é porque gostamos de alguma coisa que aquilo deixa de ter tanta coisa errada ou o quanto aquilo diz sobre a realidade. Você ser fã  é perceber que tem suas coisas erradas e poder criticar e evoluir com isso, porque senão colocamos uma venda, um fone e não vemos o quanto aquilo nos afeta negativamente e a sociedade como um todo. 

***

Sobre o autor: 
Me chamo João Paulo Albuquerque, mas prefiro que me chamem de Jota. Acabei de iniciar o Primeiro Ano do Ensino Médio e vou fazer quinze anos. Sou um amante de Letras, séries, livros, causas sociais (que estou procurando sempre me atualizar mais) e culinária. Sou o irmão da minha irmã, gordo sedução, irritado com ignorância e uma linda Drag Queen nos meus tempos livres.

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