abuso Amber Heard

Harley Quinn é um exemplo

9.10.16Dana Martins


Eu tava pensando: por que a Harley Quinn é alguém tão fácil de se relacionar?

E a minha conclusão é que... ela é vilã.

Mas no contexto que nós vivemos, isso significa algo mais.


Veja bem, vilão vs. herói, bem vs. mal, essas histórias a gente têm aos montes, mas através do tempo nós temos uma mudança: o que é considerado do mal. Antigamente, por exemplo, eles colocavam vilões como sendo personagens LGBT+. E até agora, mesmo que não seja com intenção de vilanizar, é muito mais fácil encontrar representatividade LGBT+ entre os vilões (hey, Harley, Poison Ivy, Mulher Gato...). Outro exemplo é o que eu até comentei no meu post sobre Esquadrão Suicida - por que esse é o filme de super-heróis com mais representatividade étnica? Porque eles vivem fazendo as minorias raciais de vilões.

No caso das mulheres, isso também acontece.

A vilã é a "femme fatale", é aquela mulher extremamente sexual (porque mulher gostar de sexo é errado!), é a mulher mais inteligente que o homem e vai engana-lo. Pensa em Mística. (que só não é mais vilã nos filmes novos do X-Men por causa da Jennifer Lawrence)


mulher mais sexualizada: vilã!!!!
A mocinha, não. A mocinha é aquela coisa boazinha que segue os Padrões™ e vai ser salva pelo seu herói. A super-heroína não pode incomodar muito, e aí acaba caindo no machismo. 

Então no fim do dia é muito mais fácil se reconhecer em uma personagem como a Harley Quinn do que em uma mocinha que representa a pressão puritana colocada sobre as mulheres. E nem só em termos sexual, mulheres sendo engraçadas, mulheres com personalidades diferentes consideradas "indesejáveis", são todas varridas pra caixinha de "não é a garotinha perfeita". 

Breaking news: mulheres não são perfeitas. Não precisam ser perfeitas.

Além disso, como a vilanização de certas características não acontece só na ficção, as mulheres que sofrem com o estigma no mundo real podem se identificar.

Eu sou errada aqui, ela é errada - boom, identificação. 

Lembrete de que a pessoa é considerada errada, mas por coisas que não são necessariamente ruins. Qualquer mulher que foge dos padrões, por exemplo. oh, são as feministas!! olha a puta que deu pra todo mundo!! olha a mulher que abandonou o marido!!



Vê o caso da Amber Heard com o Johnny Depp. Ele agrediu ela, e a Amber deu prova de foto, e gravou vídeo pra comprovar o comportamento dele, e doou todo o dinheiro do divórcio pra vítimas de abuso e ela e o Johnny ainda assinaram juntos um documento confirmando que ele bateu mesmo nela. Mas mesmo assim ainda tem gente querendo desculpar o que ele fez, e tratar ela como interesseira, dizer que fez isso por dinheiro e até mesmo usaram o fato dela ser bissexual pra tentar justificar ela apanhar. 

Para pra refletir sobre isso. A mulher viveu com um homem agressivo, foi agredida, e ainda assim foi vista como a vilã da história.

Na ficção, quantas Ambers são representadas como vilãs?

E a partir do momento que uma personagem como a Harley Quinn ganha espaço, ao ponto de se transformar em alguém desejável, em ser uma personagem de peso, existe também um empoderamento pra essas mulheres. QUER SABER? FODA-SE, SOU VILÃ MESMO. HAHAHA E TO ME DIVERTINDO. BJS



Como se tudo isso não bastasse, vilãs em si são um outro tipo de representatividade necessário pra mulheres. Eu quero ver mulheres feias, que fazem coisas terríveis, que são gênios do mal ou apenas são um trator humano fazendo merda por aí. Eu quero mulheres que quebrem as regras. Não é nem sobre seguir essas mulheres como referência - mas sobre quebrar a ideia de que mulheres são esse tesourinho delicado. Então alguém como a Harley ajuda a preencher esse vazio de representatividade.

Enfim, recap:

1- Acho que existe um fator de que características "de vilã" associadas a Harley, na verdade, representam mulheres se libertando. É só homem que acha ruim e escreve como coisa de vilão.

2- E quando na vida real a mulher se acostuma a ser vilanizada, é fácil se ver em uma personagem que também é vista assim. 

3- Além disso, a gente precisa de mais mulheres vilãs.


Mas pra fechar, talvez o principal esteja na própria história da Harley Quinn, porque a origem dela é a história de uma mulher que foi vítima de abuso. A Harley Quinn é como uma caricatura desses relacionamentos abusivos que são romantizados na ficção. Só que com ponto a mais: ela se livra disso. Ela consegue crescer e ser independente além desse passado abusivo.

"O Coringa não é seu interesse romântico - ele é sua história de origem. Ele é o que a transformou na pessoa que ela é agora - mas ele NÃO é seu interesse romântico, ele é quem abusou dela." (x)

(e mesmo nas histórias que ela não supera isso... eu acho que mal ou bem ela representa essas mulheres que ficam presas nesses ciclos de abuso)

(Leia aqui a Margot Robbie falando sobre Harley Quinn e a força das mulheres)

(interessante é que a primeira temporada de Jessica Jones é exatamente a mesma história. O Kilgrave até se veste de roxo igual ao Coringa!!! E tanto na série da Jessica Jones, quanto no filme do Esquadrão Suicida, existe um paralelo com ideia de "meu príncipe encantado") (mas falando sério, homem abusivo sendo romantizado na ficção TEM AOS MONTES. é um dos maiores problemas de representatividade feminina atualmente, e acho que personagens como a Jessica Jones e a Harley Quinn são uma resposta a isso)




*role model = um modelo de referência, alguém pra você aspirar ser igual

HARLEY QUEEN NÃO É UMA ROLE MODEL, MAS

Ela ainda é uma mulher bissexual e judia que veio de uma família problemática e se tornou psiquiatra no ARKHAM ASYLUM.

Apesar de vir de relação extremamente abusiva, ela ainda conseguiu ter amigos, uma saúde mental funcional e uma relação saudável com uma mulher.

Ela ainda é uma pessoa que tentou MUITAS vezes se redimir no passado. Ela falhou, mas tentou.

Ela ainda é uma mulher que sofreu abuso e conseguiu sua vingança contra quem a abusou e conseguiu construir uma vida sem ele, fazendo seu próprio nome como uma vilã do Batman.

Ela ainda é um dos poucos vilões que quase mataram o Batman, apesar de ser escrita apenas como uma sidekick (ajudante) na época.

Ela ainda é uma vilã que tem morais e um ponto fraco por criança, animais e amigos.

Depois de ir pra Arkham, depois do abuso, depois de todas as vezes que ela quase morreu, depois de toda a dor e todas as vezes que ela tentou ter uma vida melhor sem sucesso, depois de lidar com problemas de saúde mental, até mesmo depois de ficar grávida em outro universo, ela ainda, de algum modo, olha para o mundo com felicidade e otimismo.

E eu quero essa força. Não pra explodir prédios e matar pessoas como ela, mas a força dela. Harley Quinn não é uma role model, mas ela é alguém de quem você pode aprender muito. 





--------------------

Em outras notícias, o Batdrama agora é enviado por email, só se inscrever nesse link. Falo sobre vida, cultura pop, representatividade e escrita. São coisas mais passageiras que não cabem num post, mas são legais de compartilhar. 

TAGS: , , , , , , , , , , , , ,

MAIS CONVERSAS QUE VOCÊ VAI GOSTAR

2 comentários

  1. Eu gosto do fato da Harley ter uma certa moral (pelo menos em alguns universos). Eu tava lendo Injustice, e não só ela está do lado do Batman (o lado que não quer o Superman como um ditador) como também tem um capítulo que ela tá lutando com a Canário Negro, e vencendo a batalha, até que ela percebe que a Canário tá grávida e desiste da luta, pra virar amiga dela. Geralmente não gosto muito das personagens femininas nas histórias (sempre bobinhas e correndo atrás de um cara), mas gosto da Harley, por todos esses motivos que você citou

    ResponderExcluir

Posts Populares