análise clube de escrita

Clube de Escrita: Como analisar criticamente um texto, estrelando: Libba Bray

4.7.13Dana Martins


Oi, gente. (: Venho hoje em um post rápido e longo ao mesmo tempo. É que eu estive estudando um conto para ver a estrutura e pensei: por que não colocar o resultado lá no CC? Pode ajudar os outros também. Essa semana mesmo estive conversando com o João sobre pensar profundamente uma história... Se você tem curiosidade de como é feito, esse post aqui ajuda um pouco. 

Calma aí, o que tem para hoje? Bife com batatas Basicamente, o meu resumo, fichamento e conclusões sobre o que a Libba Bray fez para desenvolver a estrutura da história. 

POR QUE EU FIZ ISSO? PORQUE EU SOU MALUCA E SAIO ANALISANDO CONTOS POR DIVERSÃO, OU 

Ou porque eu precisei. Eu estou escrevendo um conto e fiquei meio insegura no estilo: será que dá para desenvolver tudo o que eu quero em apenas um conto? Então decidi usar minha própria dica lá do Pílulas de Inspiração e perguntar aos mestres. A resposta? Dá mesmo! Veja abaixo o que eu fiz para chegar a essa conclusão.

O FANTÁSTICO RESUMO QUE NA VERDADE É SÓ UM RESUMO

O conto é da da Libba Bray para o "Steampunk!: An Anthology of Fantastically Rich and Strange Stories", com o título "The Last Ride of The Glory Girls." Uma tradução pobre do título seria: A Última Viagem das Glory Girls. Me recuso a traduzir Glory Girls, já que é o nome do grupo de garotas da história.

Bem, The Last Ride se passa em algum tempo perdido entre passado e futuro com toda uma ambientação steampunk do faroeste. Adelaide é uma garota que cresceu no meio de tradições religiosas rígidas dos Believers e, como boa garota, seguia tudo certinho. Nas horas vagas, ela ajudava um relojoeiro (watchmaker) com suas engrenagens. Só que ela acabou perdendo tudo e foi tentar a vida em uma cidade grande, onde também perdeu suas poucas posses e acabou recorrendo ao roubo, o que não deu certo. Mas ela não é qualquer garota. Ao se ver presa sem a menor chance de conseguir a liberdade dá um jeito de destrancar a fechadura e... é pega. É assim que Adelaide Jones recebe a chance de escolha: trabalhar para os Detetives Pinkerton, ou voltar para a cadeia.

A história não acaba aí, porque precisamos encaixar ainda as Glory Girls. Enquanto Adelaide trabalhava mexendo em máquinas para os Pinkertons, a fama das Glory Girls foi crescendo a tal ponto que a polícia era vista como idiota. E qual a solução? Adelaide, como única agente mulher, ganha uma nova escolha: o que acha de se infiltrar nas Glory Girls e descobrir como um bando de garotas e uma máquina estranha estão dando a volta nas autoridades?

O que ela faz. Ela só não esperava gostar tanto daquilo a ponto de se ver em um dilema. Como ajudar as Glory Girls? Como fugir das autoridades? O que fazer diante de uma sociedade opressora machista? O que fazer com... a sua chance de escolha em um mundo sem escolhas?

O FICHAMENTO QUE NA VERDADE VEIO ANTES DO RESUMO

Para chegar a esse resumo do conto, primeiro eu tive que entender o que a autora falava em cada trecho da história. Então eu fiz tipo um fichamento (se não sabe o que é, dá uma olhada no google, é ótimo para entender textos).

Trecho 1
Fala do mecanismo de alterar o tempo e o que as Glory Girls fazem.
Descreve também o ambiente meio faroeste e dois grupos da sociedade: os Believers e os Miners.
Dá uma breve introdução a cada Glory Girl.
Cena: Elas estão se preparando para invadir mais um trem.

Trecho 2
Corta a cena: para entender o que vai acontecer a seguir e como aquela é a última viagem das Glory Girls ela precisa explicar o passado.
- Como foi criada para ser uma Believer
- Como ela também acaba virando uma watchmaker
- Como ela foi parar na cidade, perdeu tudo e entrou para os Pinkertons
(durante a conversa explica mais sobre Believers)
- Como ela conseguiu o lugar dela nos Pinkertons (marca de sociedade machista)

Trecho 3
A vida dela nos Pinkertons e o crescimento da fama das Glory Girls, fazendo de trouxa a polícia e fazendo os detetives Pinkertons decidirem infiltra-la entre as Glory Girls.

Trecho 4
Como eles armaram para ela conhecer as Glory Girls.
(um pouco sobre Believers e a má fama da protagonista espalhada na cidade natal)
- Passagem para as Glory Girls confiarem nela
- Conhece a máquina do tempo

Trecho 5
Ensinamentos do watchmaker tutor no passado dela, um pouco sobre a morte da mãe e tradições believer. Foco no conceito de tempo.

Trecho 6
Mais sobre cada uma das Glory Girls, mais sobre a protagonista
(mais sobre Believers e a história com John Barks)
Tudo isso interligado pela necessidade de pegar uma planta nos campos dos believers para fazer a máquina funcionar

Trecho 7
Felicidade de viver com as Glory Girls e abandonar os Pinkertons
(desenvolvimento da proximidade com a Colleen)

Trecho 8
Ela desbloqueia o tempo

Trecho 9
Ela conta para as outras sobre desbloquear o tempo

Trecho 10
Os Pinkertons pegam ela e colocam a escuta
(Detalhe: foi o cara machista do início que criou)

Trecho 11
Só um parágrafo para fechar a cena e mostrar ela voltando e mentindo

Trecho 12
Desenvolve a culpa. As Glory Girls sendo denunciadas através dela e ela não fazendo nada. Cria paralelo com a história do John Barks no passado, da qual ela também se sente culpada.

Trecho 13
Continua no trecho do início, chegou a hora de invadirem o trem. Mostra a sabotagem, Pinkertons vindo, as outras Glory Girls descobrindo e a solução da protagonista.
(detalhe: as garotas olham fixamente para ela no momento.)
- Entrega o aparelho de viagem no tempo para os Pinkertons e é liberada.

Trecho 14
A visão dela quando Believer e as verdades sobre o pecado

Trecho 15
Como ela enganou os Pinkertons.
Descreve a vida continuando e você escolhe o que fazer dela. Mas é uma escolha 8 ou 80?

RASCUNHOS DE RESUMO E REFLEXÕES SOBRE O QUE É O SIGNIFICADO DA HISTÓRIA

A história do Last Ride:
Elas se preparam para assaltar o trem, mas quando estão lá dentro percebem que foi uma sabotagem e a protagonista, se sentindo culpada, salva as garotas usando a máquina do tempo. Depois é pega pela polícia, consegue enganar e fugir com a máquina do tempo e termina refletindo sobre a vida. Mas pra você entender tudo isso, você tem que entender a vida da personagem, como ela entrou para as Glory Girls e, para isso, como ela entrou para os Pinkertons e, ainda mais, como era a vida de Believer dela.

Ou seja, a autora quebra um momento ao meio para colocar todo o conteúdo prévio que você tinha que saber. A história em si é a última viagem das garotas, que começa com a cena do início e fecha no final. Mas em vez de fazer uma introdução enorme para você entender o drama dessa última viagem, a Libba Bray quebra o momento principal ao meio e encaixa o conteúdo aí. 

Acho que os três principais pontos de conceito são: escolha, liberdade e tempo.

Refletindo sobre a visão (mais para quem leu o conto. o que a autora quer dizer com isso?)
Por que ela vê tudo escuro? Porque é incerto, você decide. O futuro dela depende da escolha que ela fizer. Ao mesmo tempo, pode ser algo sobre o sistema: eles não enxergam nada porque não tem nada para enxergar, e isso é uma forma de cada um sozinho achar que não foi liberado dos próprios pecados e viver com medo seguindo a tradição para se render.

QUAL O OBJETIVO DE FICAR VENDO TUDO ISSO EM UMA HISTÓRIA?

A autora desenvolve os Pinkertons, os Believers e as Glory Girls bem. Consegue criar um clima de faroeste e algo antigo. Desenvolve a história da personagem. Desenvolve os conflitos internos. E, mais importante de tudo, ela cria uma história legal que você quer ler e saber mais de todos os personagens. Como ela consegue fazer isso?

O jeito que eu encontrei de descobrir essa resposta é igual a médico: abrindo o corpo e vendo o que tem lá dentro. Então depois de sequestrar a Libba Bray eu peguei a história e dividi em trechos menores (fichamento) para ver o que ela fazia em cada ponto. Por exemplo, reparei que quase em todos os trechos ela faz uma referência e aproveita para explicar sobre os Believers. Algo que eu gostei foi ver como ela desenvolveu a personagem Colleen, que aparece umas três vezes e você consegue imaginar bem o tipo de pessoa.

Também foi legal ver como ela aproveita um momento para encaixar outras informações. No início, a protagonista está parada esperando o próximo trem que as Glory Girls vão roubar, ela descreve de modo geral o ambiente e encaixa informações.

"It were spring, and the Believers had come to baptize their young in the Pitch River."

Apenas uma frase e a autora te disse: É primavera, existem um grupo de Believers na sociedade e eles têm uma tradição sazonal de batizar os jovens. Mais do que isso: "Believers", "batizar" e pela ideia de tradição você já sabe que é alguma coisa meio religiosa levada a sério.

Não é uma conexão consciente que a gente faz, mas é um pedaço de informação que ajuda a sustentar a história. Ao longo do conto, essa tradição e os Believers reaparecem muitas vezes, cada vez mais dando a chance de aprofundar a história.

Aliás, isso é algo muito frequente nesse conto. Ela dá migalha de tudo. Migalha sobre Glory Girls, Pinkertons, Believers, o mundo no geral. Até meio repetitivo depois que você percebe. E a cada migalha vai ficando maior até que você entende tudo e, no final, é só mais uma ação conclusiva.

Ela também desenvolve um certo suspense, enquanto você lê fica se perguntando: Quem é John Barks? Como ela vai se juntar às Glory Girls e no que isso vai dar? Qual é a visão dela? Como ela vai lidar com a questão da máquina que controla o tempo?

Comentário aleatório: Se você conhece inglês, sabe que "It were spring" está errado e no texto todo tem essa caracterização dos personagens pela maneira de falar.

O importa aqui, para mim, foi ver que dá para criar algo bem detalhado com pouco texto (até em caso de você achar que 50 mil palavras não são o suficientes para uma história completa). Peguei também alguns "truques" de como mexer as informações PARA A REVISÃO FUTURA do texto.

Eu não acredito que a Libba Bray tenha planejado a fundo tudo isso, até porque ela já se declarou como alguém que não faz um roteiro claro. O texto também é bem denso e misturado, foi até um pouco complicado tirar com a pinça algumas partes para analisar de modo cru.

VOCÊ GOSTA DE QUEIJO?

Ou já sentiu alguma insegurança parecida de não saber exatamente como desenvolver certo assunto? Tem alguma coisa atrapalhando a sua história? Ou tem a própria dica? Compartilhe também. (:

-dana martins
*eu percebi que não estou com paciência, ou tempo, para criar um post bonitinho formatado, revisado ou sei lá. então se você viu qualquer erro... a culpa foi minha mesmo. adoraria que você avisasse, que eu quero arrumar (:

Links que eu andei lendo sobre o conto:
steampunk! an anthology of fantastically rich and strange stories – guest post by alexis of lit from woe
REVIEW: Steampunk! edited Kelly Link and Gavin Grant
The Last Ride of the Glory Girls
Trecho do início

TAGS: , , , , , , , ,

MAIS CONVERSAS QUE VOCÊ VAI GOSTAR

1 comentários

  1. Estou num momento de crise com o meu conto e lembrei desse post. Achando que as coisas tavam muito simples, sabe? Que eu tava escrevendo parágrafos de texto com um único propósito, que não traziam informações além que enriquecessem a história.

    Ainda não sei se ajudou porque não voltei a escrever, mas foi ótimo ler isso e me fez pensar em algumas alternativas. Obrigado.

    ResponderExcluir

Posts Populares