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[Resenha] The Black Tides of Heaven, de J.Y. Yang

11.1.19Dana Martins


Estou tentando falar sobre The Black Tides of Heaven, e falhando. Esse é um livro de fantasia, mas não como você espera. Está bem mais pra Avatar/A Lenda de Korra do que Guerra dos Tronos. Mas diferente desses, é escrito por uma mente que parece viver na mesma época que a gente, retrabalhando o mundo no que se trata de questões de gênero e sexualidade. E a forma de escrita, ainda que trazendo a poesia comum das histórias de fantasia, é simples e direta. Acima de tudo, é uma história que me fez gostar dos personagens e querer ver o que ia acontecer.

Se você não me conhece: Oi, eu sou Dana. E uma coisa sobre mim é que quanto menos eu sei sobre um livro, mais eu quero ler. Normalmente escolho livros pela capa - o que foi o caso de The Black Tides of Heaven (tudo bem, também porque depois de conhecer o livro eu comecei a seguir no twitter J.Y. Yang, que escreveu a história, e aí deu mais vontade ainda) (escrevendo essa resenha também lembrei que já tinha lido um conto que J.Y. Yang fez pra Uncanny Magazine, você pode ler de graça aqui). Enfim, mas eu gosto de ler um livro aberta a qualquer possibilidade. Quem é o protagonista? O que vai acontecer aqui?? Qual é o ponto dessa história? Não sei, eu quero descobrir lendo.

E foi o caso de Black Tides of Heaven, que começa de uma maneira bem cinematográfica: um monge subindo uma escadaria de milhares de degraus, para encontrar a Protetora - uma figura de poder que governa o lugar onde se passa a história. Eles tinham feito um acordo para o Monastério dar apoio ao Protetorado contra uma rebelião, e estava na hora da Protetora pagar. Mas essa é a Protetora, e você nunca consegue exatamente o que quer quando se trata dela.

Não vou dizer o que acontece, mas vou dizer que é a partir daí que nós vamos conhecer a história de Akeha e Mokoya, duas crianças gêmeas que crescem tendo suas vidas manipuladas por jogos políticos e, principalmente, o destino. O negócio é que, em um mundo já mágico, Mokoya é ainda mais especial: Mokoya é profeta. E, em uma guerra política, ver vislumbres do futuro é algo extremamente valioso.

Só que conforme a gente lê vai ficando claro que essa não é a história de Mokoya, é a história de Akeha: como é ser o gêmeo descartável? A criança não planejada? Uma criança que está ali porque pelo jeito o destino quis assim, mas o que o destino quer? E principalmente: Akeha vai deixar o destino escolher seu futuro?

Em Black Tides of Heaven a gente vai vendo pedaços da vida de Akeha de ano a ano, esses conflitos tantos pessoais quanto políticos. Uma coisa que eu gostei muito nesse livro é que mesmo se passando por um trecho longo da vida - pegando a infância, adolescência e até adulto, não é uma história que parece longa. Eu já li livros que chega a ser cansativo, parece que passam milênios na história, mas isso não acontece em Black Tides of Heaven. A única coisa que aconteceu é que quando chegou no trecho dos 35 anos deu a maior tristeza porque me dei conta de que um dia os personagens iam ficar velhos e morrer e eu não queria isso. 

A leitura no geral dá a sensação de um livro YA de fantasia, mesmo que a idade do protagonista varie tanto. E o tema é bem de aprender a ser dono da própria vida. 

Agora, o que merece um destaque grande nessa resenha é o mundo: a magia aqui é como se o mundo inteiro tivesse uma rede de linhas que ligam tudo, e aí os "Tensores" são pessoas que conseguem ver essas linhas e manipulá-las. Você vê as linhas de fogo, ou de terra, e a partir delas consegue gerar coisas, curar pessoas, criar "tecnologias." Nesse mundo tem, por exemplo, fotos (e fotos móveis como gifs!), rádios e cirurgia plástica, tudo feito através da manipulação dessas linhas e certos elementos.

Um dos conflitos, inclusive, é que como os Tensores e esse conhecimento de manipular as linhas fica concentrado na mão do Protetorado, a parte mais pobre da população fica à mercê deles. E aí um grupo de resistência está querendo criar tecnologias que sejam independente de magia pra todo mundo ter acesso.

Outro momento grande é o surgimento de armas - tanto manipuladas com magia, quanto as que qualquer um pode usar. Qual é o custo disso?

A Asami de A Lenda de Korra encaixaria perfeitamente com o povo do Maquinista nessa história

Essa parte me faz lembrar muito à primeira temporada de A Lenda de Korra, que se passa em uma fase de mundo de fantasia onde estão surgindo carros e incorpora elementos de steampunk*. E a trama também é justamente que o Amon está fazendo uma revolução de não-dobradores em um mundo dominado por dobradores. Resumo: tinha como eu não gostar desse livro?

E aí, pra completar, tem como gênero e sexualidade são tratados no livro. Na cultura de The Black Tides, o gênero não é imposto nas crianças quando elas nascem, elas crescem usando termos neutros e aí elas mesmas decidem como querem ser tratadas. Quando chegam à maturidade, normalmente passam por uma cerimônia de confirmação e aí, através da magia, o corpo delas é adaptado ao que está de acordo - o que não é obrigatório, a história também mostra um povo religioso que prefere não alterar o corpo porque é assim que o "Todo Poderoso" quis. Quanto a sexualidade, tem personagens com relação de mesmo gênero e tudo é narrado de forma cotidiana, como se não tivesse a menor diferença. Tudo isso, aliás, é encaixado na narrativa e mostrado através de detalhes aqui e ali, assim como os problemas de racismo e colorismo desse mundo. Eu diria que chama atenção porque é diferente da nossa cultura, mas fora isso não deixa de ser um fato básico de construção de mundo.

Quanto mais eu lia, mais eu gostava de Akeha. Tem momentos emocionantes e fofinhos. O final me deixou desesperada e acabada. É uma história que eu recomendo muito, porque é leve e curta (na real, é uma novela, não um livro inteiro, mas eu já vi que enquanto nos EUA eles fazem bastante essa distinção, aqui no Brasil é tudo vendido como livro), e também porque tem o frescor de ler uma história em um tipo de mundo familiar de fantasia que incorpora novos elementos. Não tem a chateação daquele sempre garoto branco sendo o escolhido com os mesmos dramas de sempre. 

The Black Tides of Heaven foi o livro que eu escolhi como preferido de 2018, e é um das duas únicas histórias que me deram vontade de ler e eu li no ano (o outro foi Tartarugas Até Lá Embaixo, do John Green, que eu já fiz resenha aqui). 


THE BLACK TIDES OF HEAVEN, de J.Y. Yang, até agora só foi lançado em inglês e é o livro gêmeo de "The Red Threads of Fortune," que eu imagino que seja contando a mesma história, só que da perspectiva de Mokoya. Já vi também que saiu o The Descent of Monsters, que eu também acho que fala sobre o mesmo período histórico só que é de um investigador??? Eu não sei. Só sei que o ebook na Amazon é super barato.

Nota:


The Tensorate Series
Book 1: The Black Tides of Heaven
Book 2: The Red Threads of Fortune
Book 3: The Descent of Monsters
Book 4: The Ascent to Godhood

Eu tinha lido que tanto fazia a ordem de ler o The Black Tides of Heaven e o The Red Threads of Fortune, então eu peguei o que eu gostei mais da capa, mas acabou que é considerado o primeiro. Só sei que eu adorei o jeito que J.Y. Yang escreve, e é uma pessoa que eu tenho uma simpatia de graça mesmo sem conhecer, e tenho vontade de ler mais coisas. 


*DANA, SOCORRO, O QUE É STEAMPUNK?
Steampunk é um subgênero de fantasia/ficção científica que se trata de histórias que você tem tecnologia super avançada em um contexto histórico que elas não existiam, mas com os recursos que existiam. Então você costuma ter umas engenhocas complexas cheia de engrenagens movidas a vapor, feitas de madeira ou metais tipo cobre e ouro. 

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